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Política

Bolsonaro acusa OMS de incentivar 'masturbação' e homossexualidade

Presidente distorceu publicação criada pelo órgão em 2010 para auxiliar educadores e governantes no ensino da saúde sexual e prevenção de abusos, doenças sexualmente transmissíveis e gravidez

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a atacar a Organização Mundial da Saúde (OMS) na noite desta quarta-feira, 29, em uma publicação na sua conta oficial do Facebook. Sem citar fontes, o presidente divulgou uma suposta lista de diretrizes do órgão que, de acordo com ele, incentivariam crianças de 0 a 12 anos à masturbação, à homossexualidade e à primeira relação sexual.

“Essa é a Organização Mundial da Saúde (OMS) que muitos dizem que eu devo seguir no caso do Coronavírus. Deveríamos então seguir também suas diretrizes para políticas educacionais?”, questionou Bolsonaro, antes de listar supostos itens que a entidade da Organização das Nações Unidas teria indicado a crianças.

Na publicação, que já foi apagada de sua conta no Facebook, o presidente acusou a OMS de incentivar, para crianças entre 0 e 4 anos, “satisfação e prazer ao tocar o próprio corpo *masturbação*” e “expressar suas necessidades e desejos, por exemplo, no contexto de ‘brincar de médico”.

Já para crianças de 4 a 6 anos, o órgão, de acordo com o presidente, recomendaria “identidade de gênero positiva”, “gozo e prazer ao tocar o próprio corpo”, “masturbação na primeira infância” e “relação entre pessoas do mesmo sexo”. Por fim, o presidente acusa a OMS de incentivar a “primeira experiência sexual” entre crianças de 9 e 12 anos.

As acusações foram compartilhadas horas antes por Arthur Weintraub, assessor especial da Presidência e irmão do ministro da Educação, Abraham Weintraub, em sua conta oficial no Twitter. Na publicação, ele afirma que a OMS também incentivaria o ensino da suposta “ideologia de gênero” e o “prazer e a diversão” em crianças de 0 a 4 anos.

O que diz a Organização Mundial da Saúde sobre sexualidade na infância?

As acusações feitas por Bolsonaro e Weintraub são, na verdade, distorções de um guia da Organização Mundial da Saúde, com indicações para educadores, pais, responsáveis e governantes, mas não para as crianças. Intitulado “Normas para a educação em sexualidade na Europa: uma estrutura para formuladores de políticas, autoridades educacionais e de saúde e especialistas”, o documento foi publicado em outubro de 2010.

Desenvolvida pelo escritório regional da OMS na Europa e pelo Centro Federal da Alemanha para Educação em Saúde (BZgA, na sigla original), a publicação traz diretrizes focadas especificamente para países da Europa Ocidental e da Ásia Central. O objetivo, de acordo com publicação oficial no site da organização, é apoiar “profissionais da saúde e da educação no esforço para garantir que crianças tenham informações precisas e apresentadas de forma sensível sobre sexualidade”.

As recomendações feitas pelo documento são baseadas em uma “interpretação positiva da sexualidade”, a qual eles definem como “parte natural do desenvolvimento humano e aspecto central de um ser humano ao longo da vida”. Alguns dos tópicos abordados no documento trazem indicações para a prevenção de HIV/Aids, gravidez precoce e violência sexual, por meio de “informações imparciais e cientificamente corretas”.

Na publicação, a OMS e a BZga ainda alertam que o documento tem como intenção apoiar crianças na “consciência de seus próprios limites e como comunicá-los” e a “desenvolver atitudes tolerantes e respeitosas, que são um pré-requisito para uma sociedade justa e igualitária”.

Os trechos destacados e descontextualizados pelo presidente e por seu assessor são tópicos de uma lista voltada para educadores, na qual os próprios órgãos alertam que as matrizes devem ser analisadas com base no “desenvolvimento individual” de cada criança e que os limites de idade devem ser “flexíveis”. “Os tópicos tem por objetivo antecipar estágios de desenvolvimento para que as crianças estejam preparadas ao lidar com eles em diferentes níveis de entendimento”, diz a publicação. Ao definir a diretriz para o “respeito à igualdade de gênero”, o documento aponta que o objetivo é que crianças aprendam que meninos e meninas são iguais.

Em nenhuma parte da publicação há o incentivo para que crianças pratiquem “masturbação”, “homossexualidade” ou tenham “relações sexuais”. Na verdade, o documento alerta que questões como “masturbação precoce” e “descobrimento do próprio corpo” podem surgir em diferentes idades, e orienta os educadores a promoverem uma “imagem corporal positiva”, o “respeito a todos e às diferenças”, “aceitação da diversidade, de inseguranças sobre o corpo e direitos iguais” e a noção de que elas podem pedir ajuda.

Até o momento, a Organização Mundial da Saúde não se pronunciou sobre a publicação do presidente. Há dois dias, Bolsonaro já havia atacado o diretor-geral do órgão, Tedros Gebreysus, afirmando que não seguiria suas recomendações por ele não ser médico.

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