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Bolsonaro admite atrasar data do Enem, mas exame será realizado neste ano

Educadores, alunos e entidades educacionais cobram adiamento da prova em razão dos prejuízos aos alunos provocados pelo novo coronavírus.

Em meio aos pedidos de adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 por parte de educadores, alunos e entidades de educação, o presidente Jair Bolsonaro não descartou a possibilidade de "atrasar um pouco", desde que seja realizado ainda neste ano. "O Enem, estou conversando com o Weintraub, né? Se for o caso, atrasa um pouco, mas tem de ser aplicado esse ano", disse Bolsonaro.

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, defende que o exame seja mantido. Mesmo com o avanço da covid-19, as inscrições para o exame foram abertas na última segunda-feira, 11. Segundo o cronograma, a prova impressa está mantida para os dias 1.º e 8 de novembro. A partir deste ano, o candidato poderá optar pela avaliação digital marcada para os dias 22 e 29 do mesmo mês, com previsão de ser aplicada para 50 mil alunos em laboratórios de faculdades de 15 capitais do Brasil.

Educadores, estudantes e entidades de educação criticam a decisão de o Ministério da Educação (MEC) manter a realização das provas do Enem deste ano. Diante da suspensão de aulas por causa da pandemia do novo coronavírus, ainda sem definição para serem retomadas, a desigualdade de ensino é a principal bandeira levantada por aqueles que pedem o adiamento do exame. Além disso, ainda há incertezas sobre os riscos da covid-19 no País em meados de novembro com as aglomerações provocadas para a realização do exame.

"As políticas educacionais que vêm sendo implementadas de educação a distância, quando em caráter oficial, e a não postergação do Enem estão abraçando as desigualdades sociais e educacionais e, portanto, são discriminatórias. E isso é não só inconstitucional já que é violação primária de direito à educação equitativa e universal como também e uma irresponsabilidade por parte do poder público", afirma Andressa Pellanda, coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Escolas da rede privada recorreram ao ensino à distância para manter o aprendizado. Na rede pública, a mesma iniciativa enfrentou obstáculos. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 30% dos domicílios não usam internet. Para amenizar a situação, aulas começaram a ser transmitidas pela televisão e pelo rádio. Mesmo assim, a ação não é suficiente para manter a igualdade de ensino, estando longe de um modelo ideal de ensino online.

Além disso, muitos alunos de escolas públicas e mesmo privadas em regiões mais remotas do País ainda permanecem sem aulas (online ou presencial), ou seja, não poderão se preparar adequadamente para o exame em novembro. "Existem outras problemáticas estruturais que muitos estudantes da rede pública enfrentam, como a falta de estrutura domiciliar adequada, a fome, falta de formação adequada dos pais ou responsáveis (38 milhões de adultos estão em situação de analfabetismo funcional no Brasil) e a falta de tempo e atenção destes para com os estudantes, que têm que se dividir entre tarefas domésticas e trabalho. Tudo isso impacta na educação dos jovens", avalia Andressa Pellanda.

No mundo, diversos países estão reavaliando a aplicação de exames de saída do ensino médio. A maioria optou pelo cancelamento. Mas assim como o Brasil, Alemanha e Finlândia decidiram manter as provas, reforçando as ações de higiene para prevenir o risco de transmissão. Já, mais cautelosos, Estados Unidos, França e Irlanda, por exemplo, cancelaram as avaliações para reduzir os transtornos da pandemia do novo coronavírus na educação. "Estamos acompanhando as agências internacionais, mas não é possível comparar países desenvolvidos que, além de infraestrutura e financiamento adequado para a educação e para as áreas sociais e de não terem tamanha desigualdade social estrutural no país, têm lidado bem com a pandemia, que definitivamente não é o caso do Brasil", reforça a coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Em nota, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) também manifesta "profunda preocupação quanto às datas divulgadas, uma vez que estão suspensas as aulas nas escolas em todo o território nacional, bem como pelos prejuízos para os estudantes, especialmente de escolas públicas".

O ensino médio brasileiro atende 7,5 milhões de alunos, sendo 86% na rede pública de ensino. Para a entidade, as ferramentas tecnológicas usadas pelas escolas (públicas e privadas) para minimizar as perdas do período de suspensão das aulas presenciais, "elas não chegarão para todos os estudantes brasileiros".

O Consed defende que as "decisões sejam tomadas a partir do entendimento com as instituições responsáveis pela educação básica no Brasil", sendo preciso aguardar o fim da pandemia e da suspensão das aulas para que "sejam definidas as datas das provas do Enem 2020". Nas redes sociais, muitos internautas também se manifestam a favor do adiamento do Enem neste ano. Muitos concordam que alunos mais carentes podem ser prejudicados, além das incertezas sobre o fim da pandemia do novo coronavírus no País.

Em nota no Twitter, dirigentes das instituições públicas de ensino do Estado do Rio de Janeiro se mostraram contrários à manutenção do cronograma do Enem e solicitaram ao Ministério da Educação o adiamento das provas.

Mendonça Filho, ex-ministro da Educação e consultor da Fundação Lemann afirmou nas redes sociais que adiar o Enem neste ano é uma questão de bom senso.

“Enem da morte”

Em entrevista transmitida ao vivo pelo Estado na terça-feira, 12, sobre medidas a serem tomadas para diminuir o impacto da pandemia de covid-19 na educação, a presidente-executiva da organização Todos Pela Educação, Priscila Cruz, falou que a manutenção do atual calendário do Enem é um “desprezo” com os alunos mais pobres.

A prova é a principal porta de entrada para as universidades federais do País. Se o exame não for adiado, Priscila diz que o Enem deste ano vai acabar entrando para a história como o “Enem da morte”. “A morte da chance, da oportunidade, de um projeto de acesso ao ensino superior que está sendo destruído”, explica.

“É um erro absurdo o Ministério da Educação manter esse calendário do Enem”, avalia Priscila, que é mestre em Administração Pública pela Universidade de Harvard.

Entidades estudantis

A União Nacional dos Estudantes (Une) e União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), entidades representativas dos estudantes, protocolaram na segunda-feira, 11, mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ) reivindicando o adiamento do Enem.

"A desigualdade social é intensificada em momentos como esse, e boa parte dos estudantes não tem as condições para estudar à distância como as apresentadas na propaganda do Ministério. Manter a data da prova, nessas circunstâncias, é acabar com o sonho de milhares de jovens de em ingressar em uma universidade e só aprofunda as disparidades sociais e econômicas do país", afirma Iago Montalvão, presidente da Une.

As entidades estudantis convocam ainda uma mobilização nacional para que o MEC adie a prova neste ano. Elas pedem que na sexta-feira, 15, estudantes, professores, trabalhadores e toda a sociedade usem nas redes sociais a tag #AdiaEnem e pendure cartazes nas janelas reivindicando o adiamento da prova.

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