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Ibama perde 45% dos fiscais que combatem crimes ambientais em 10 anos

Principal órgão do governo federal na proteção da Amazônia tem hoje 591 agentes ambientais para enfrentar o avanço do crime ambiental em todo o País.

Longe das prioridades orçamentárias para combater o desmatamento na Amazônia, o Ibama vive hoje a situação mais crítica de toda a sua história em relação ao número de fiscais que dispõe para realizar operações em campo. Principal órgão do governo federal na proteção da maior floresta tropical do mundo, o Ibama possui atualmente 591 agentes ambientais para enfrentar o avanço do crime ambiental, e isso não só na Amazônia, mas em todo o País.

Dados oficiais do órgão obtidos pelo Estadão mostram que o quadro atual de agentes é 45% inferior ao que o instituto detinha dez anos atrás. Em 2010, eram 1.311 fiscais em atuação. Trata-se do pior cenário de fiscalização desde a fundação do Ibama, em 1989.

A atuação desse grupo de profissionais é mobilizada para diferentes localidades do Brasil, conforme a necessidade e época do ano. A Amazônia costuma concentrar a maior parte desses servidores, principalmente no atual período de seca.

Só em 2019, a redução do número de agentes de fiscalização ambiental foi de 24% sobre o ano anterior. Basicamente, são duas as causas desse esvaziamento: aposentadoria de servidores e falta de concursos públicos para renovação o quadro funcional.

Nos últimos dez anos, a queda de fiscais só teve uma pequena paralisação entre 2015 e 2016, quando o órgão elevou seu quadro de 930 para 989 fiscais. De lá para cá, no entanto, o processo de esvaziamento prosseguiu.

Dois meses atrás, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, enviou um ofício ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, no qual descreveu a situação crítica e pediu autorização do chefe para realizar um concurso. Este previa a contratação de servidores não apenas para a área de fiscalização, mas também para analistas e técnicos administrativos. São áreas distintas. Um fiscal de campo não cuida de licenciamento ambiental, por exemplo.

O Ibama solicitou, ao todo, a recomposição de 2.311 servidores, dos quais 970 poderiam atuar nas ações em campo. O impacto dessas contratações no orçamento de 2021 seria de R$ 66,6 milhões. O pleito, até o momento, não foi atendido pelo governo.

No ano passado, o Tribunal de Contas da União chegou a recomendar à Casa Civil da Presidência da República que analisasse as “carências operacionais” do órgão, devido à falta de capacidade de execução do instituto.

Silêncio

A reportagem questionou o Ibama e o MMA sobre a situação atual e medidas a serem tomadas para tentar minimizar os problemas. Não houve resposta do Ibama até o fechamento deste texto. O MMA declarou que encaminhou a solicitação de concurso público ao Ministério da Economia, que até agora não se posicionou sobre o assunto.

Fora dos gabinetes de Brasília, a situação é crítica. Para coordenar suas 79 unidades espalhadas pelo País, o Ibama precisa deslocar ao menos dois agentes fiscalização. Na prática, isso significa 158 homens a menos em campo.

No mundo ideal, só a área de fiscalização do Ibama teria de contar, segundo informações técnicas da própria autarquia ligada ao MMA, com 1.778 agentes. Hoje, portanto, dispõe de exatamente um terço do que é necessário.

O quadro atual de servidores do Ibama, em todas as suas áreas, soma 2.800 funcionários, número que também remete ao momento mais crítico da instituição. Em 2007, por exemplo, chegou a ter 6.200 empregados. Desde então, essa força de trabalho não parou de cair.

Além de prejudicar a fiscalização das florestas, a situação compromete funções como licenciamento ambiental, com diminuição do número de licenças analisada e concedidas, e arrecadação ligadas a demora na análise de autuações e processos e da cobrança.

Em análise técnica, o Ibama afirma que a situação atual “remete a um acentuado decréscimo da força de trabalho da fiscalização ambiental sob o aspecto quantitativo e qualitativo, que implica em graves consequências para o exercício da fiscalização ambiental, sobretudo para o combate ao desmatamento ilegal na Amazônia e o cumprimento das metas e das competências federais em fiscalização ambiental”.

Reportagem publicada pelo Estadão na semana passada mostrou que o Ibama pode sofrer ainda uma redução de quase metade em seus recursos destinados ao combate do desmatamento na Amazônia, em 2021.

Documento enviado pelo Ministério da Economia ao MMA aponta que o valor disponibilizado para o ano que vem nestas operações será de R$ 88,4 milhões, uma redução de 43% sobre os R$ 154,730 milhões previstos para 2020. O orçamento geral prevê a destinação de R$ 210 milhões ao Ibama, 33,6% inferior ao orçamento de R$ 316,481 milhões deste ano.

O órgão também foi preterido quanto à divisão de R$ 630 milhões da Operação Lava Jato que, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de setembro de 2019, devem ser usados exclusivamente para financiar ações de fiscalização e combate aos incêndios florestais na Amazônia.

Dos R$ 630 milhões repassados pela Petrobrás a partir de seu acordo anticorrupção assinado com a Justiça, R$ 530 milhões, o equivalente a 84%, foram destinados ao Ministério da Defesa, com repasses distribuídos entre Exército, Marinha e Aeronáutica. Desse montante, o governo repassou apenas R$ 50 milhões ao Ibama. Já o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e a Funai não foram contemplados com nenhum repasse.

Ação militar

A redução do quadro impacta na fiscalização, uma vez que esses fiscais não podem ser substituídos por militares em todas as suas funções. Por lei, nenhum militar tem atribuição ou autorização para aplicar multas ambientais, assim como não podem fazer autuações, apreensões ou destruições de equipamentos. Essas práticas são de competência exclusiva do Ibama e do ICMBio.

O Ministério da Defesa confirmou, por meio de nota, que “as autuações, prisões, apreensões e inutilizações são de competência exclusiva dos órgãos encarregados”, Ibama e ICMBio. Em todas as ocasiões em que os militares participam de operações que resultem nessas ocorrências, portanto, precisam estar acompanhados de membros desses órgãos ambientais.

A pasta também detalhou que a Operação Verde Brasil 2, liderada pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, é “resultado da atuação das Forças Armadas e de diversos órgãos e agências, que conduzem ações para reprimir os delitos ambientais na Amazônia”.

As ações dos militares em campo, segundo o Ministério da Defesa, compõem “atividades de coordenação, planejamento e inteligência” e “seguem um fluxo permanente nos comandos conjuntos constituídos, bem como nas reuniões em Brasília com dirigentes dos órgãos envolvidos”.

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